Do meu Diário (2)
Sabes,
meu Amor?
…
Não! Não sabes, tenho de perder o hábito de pensar que tu sabes tudo. Não estás
cá…deixaste-me neste lençol de cetim que tantas saudades me evoca…partiste
sozinha sem te despedir…nem sequer um adeus ao longe. Cobriste-te com aquele
manto diáfano que me deixa ver-te, tocar-te mas…não estás lá. A tua face evoca,
ainda, os tempos delirantes de felicidade, basta o teu constante rodar de olhos
pelas paredes do quarto observando…oh! como gostaria que fosse um olhar atento…não…eles
passam por mim e não param…
É
isso que me dilacera…não ser jamais o objeto da tua atenção, não ler neles a
interrogação…sobre aquele pequeno incidente do dia anterior pelo qual esperavas
da minha parte uma qualquer observação, de censura ou regozijo…quando apenas
querias…a minha atenção no fim do dia em que, cansado, chegava a casa e só
querias participar no que eu fizera, como reagira, como desbravara os obstáculos
na nossa empresa.
Olha?
Lembras daquela última…meu Deus, última!…dança, uma valsa…no parque da Curia? Oh!
Como me recordo…tínhamos vindo de Cascais há poucos dias, de armas e bagagens
feitos para gozarmos os “últimos tempos” antes que a tua doença “te levasse”. Procurávamos
a bonança dos pensamentos, a tranquilidade da natureza tão pródiga naquele
local. E fomos surpreendidos pela existência de uma orquestra de baile deliciando
com os seus acordes os poucos frequentadores da sala de chá.
Lembro
que sorriste…não acrescentas-te qualquer palavra mas, como hábito, disseste
tanta coisa…
Não
sei se para ti foi uma despedida…a tua despedida deste enorme prazer que sempre
foi para mim ter-te nos meus braços… bailando… apertando… acariciando…
A
minha resposta foi…pegar-te na mão e levar-te às tábuas. Vi teus olhos
agradecerem ao mesmo tempo que dizia ao meu ouvido “só nós é que dançamos?”
Rodopiámos…girámos
por todo o palco, fomos objeto de curiosidade dos poucos assistentes, mas…foi tão
bom!...
Desculpa…a
minha emoção não me deixa continuar…
Até
amanhã! Meu Amor.
(Fev
2015)
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