O Estado-providência

A subsídio-dependência das pessoas perante o Estado providencia é terrível.

A compreensão, ou a falta dela, do direito que se supõe inalienável do Homem ser protegido por uma política montada pelo Estado com intuito da sua protecção na saúde, no conforto social e, sobretudo, nas carências financeiras, nortearam as estruturas incessantemente implementadas, nomeadamente, na Europa, pelas sociais-democracias deste o período da Grande Depressão, nos anos trinta do século passado.

Foi essa, também, a grande luta no pós-25 de Abril em Portugal por todos os partidos que se iam implantando na sociedade, o dinheiro do Estado deveria socorrer os necessitados, ou seja, todos nós. Só que este principio socialmente importante foi completamente desvirtuado pela cegueira dos sucessivos governos, distribuir não é o mesmo que proteger quando indiscriminadamente se repartem recursos que não existem.

Foi isso, o governo esqueceu-se que os exemplos que vinham do Norte da Europa (a Suécia era o grande paradigma) assentavam numa economia florescente, montada no sentido da produção de riqueza.

Ora só se pode distribuir o que se produz, mesmo que no cerne possa estar o direito do Homem a ser protegido pela organização estatal. O mundo está cheio de incongruências que se pagam caro quando se vive acima das nossas posses.

E a riqueza para se distribuir tem de ser primeiro criada pelo trabalho abnegado das pessoas, não pela inércia do desemprego ou da licitude ou mesmo da necessidade.

No anos pós-revolução em Portugal distribuiu-se o que havia nos cofres do Estado e paralisaram-se os meios de produção. Ou seja, deu-se o que se havia amealhado sem ponderar que os cofres secavam em pouco tempo. Em 1977, dois anos depois, encontravam-se sem seiva alguma. Então, os iluminados da época, pensando só em parte do problema, entenderam que havia de se legalizar o Estado Providencia pois distribuir segundo a cor partidária não era a solução. E partiram para outra asneira, esta muito maior porque institucionalizada. Todos com o direito de receber nas múltiplas situações de carência, uma saúde gratuita, escrita na Constituição para que não houvesse dúvidas e impossibilitasse alterações só possíveis com uma grande unanimidade de políticos.

Esquecendo ou não (?), que ao mesmo tempo se desmantelavam industrias e agricultura e se dizia que os serviços seriam o nosso futuro, o que era o mesmo que reclamar o direito a todos a não sujarem as mãos no trabalho, a todos irem para a cama à mesma hora da noite ou a todos se divertirem nos mesmos locais e horas.

Tal foi a receita implementada que bastaram 5 anos para um início de novo afundamento financeiro. Vieram os iluminados dos Estados Unidos e pregarem-nos, então, a necessidade do Livre Mercado.

Disseram-nos que o conceito "bem-estar social" tinha de estar associado a um forte capitalismo privado. Seria a moeda de troca para o direito do Homem ser apoiado desde o nascimento até à sua morte, por um conjunto de bens e serviços de fornecimento garantido directamente através do Estado-providência ou, indirectamente, pelo seu poder de regulamentação sobre a sociedade civil.

Cresceram os potentados económicos privados, instaurou-se, definitivamente, o direito ao apoio social, esquecendo-se, de novo, que algo estaria errado no conceito da contrapartida, o desmantelamento produtivo versos entrada, mesmo que imensa, de dinheiro vindo dos cofres do Norte e Centro da Europa.

Realmente, não suponho o que esses países acreditavam como faríamos nós uso desse capital oferecido.

O certo é que se distribuiu para muitos bolsos gananciosos, de gente que adquiriu carros de grandes marcas, construiu vivendas de luxo, pintaram a cores bem visíveis as fachadas dos seus novos negócios para se supor que eram reais e fazedores de dinheiro. Não poderia ter sido de outro modo já que a riqueza não surgiu deste mar de notas.

Os projectos eram financiados mas não se fiscalizavam. Os nossos políticos fecharam os olhos ou, o que será pior de imaginar, participaram na festa nacional.

De novo, os anos se encarregaram de levar à miséria os cofres deste Estado cego.

Para sairmos da Grande Depressão dos anos trinta vingou a ideia que o desenvolvimento económico se vazia também com distribuição social de bem-estar. Este conceito sempre interferiu com as ideias liberais e os fundamentalistas do livre mercado que viam as politicas sociais como um custo e não um investimento. Só que Suécia orientou a segurança social das pessoas como um meio de alcançar maior eficiência dos mercados e uma melhor organização da produção.

Com isso, lá, a riqueza cresceu e os benefícios espelham-se nas politicas sociais.

Mas o mundo evoluiu.

O século vinte foi um período de grandes transformações politicas, muito condicionadas pelas duas guerras mundiais e seus efeitos devastadores.

Já no final, a dicotomia politica que se viveu, dos EUA e da URSS, cessou com a queda do poder soviético e os Estados Unidos, sem oposição militar, sentiram-se donos do mundo. Sucederam-se as guerras locais contra inimigos que se opuseram a este cenário único que os americanos representam.

Foi a Alcaeda e os seus seguidores. A pior forma de luta, que a busca de morte unipessoal, generalizada, inocente, dirão.

Mas somos todos responsáveis pelos dias que nasceram então.

Há muitos políticos que abraçam causas justas mas, outros, navegam ao sabor das suas conveniências, das interesses pessoais e de grupo. Tantos Chefes de Estado por esse mundo fora, tantos estadistas que só nas palavras têm boas intenções...

O século vinte e um nasceu com um enorme problema económico, o mundo está em profunda crise financeira, criou um monstro que não domina, o Dinheiro. Talvez por outras palavras se possa dizer que são os Mercados. Enquanto o dinheiro é sinónimo de ganancia, o mercado é um bicho de múltiplas cabeças, desconhecidas.

Mas, direi que os mercados têm pessoas por detrás, aquelas que representam o mercado, este, porque impessoal, é devorador, usurpador do poder soberano, o lucro, dominador arbitrário que oprime para reinar.

São, assim, os Mercados, esse monstro criado pelos Políticos com o intuito de se “olharem” sem serem vistos, que deram o mundo da economia à observação duns quantos, organizações que com o tempo se viraram contra os seus criadores.

Estamos na era do Dinheiro.

Alguém já pensou quem são os Mercados? Aquela terrível “coisa” que ninguém domina e a todos domina? Aqueles que por mais que se faça, aquém se tenta agradar, reagem sempre castigando?

Talvez, haja gente que pense não serem humanos, não terem pessoas por detrás das tão fustigantes decisões, como obrigarem as empresas de rating a diminuírem a classificação de independência a um nível de “lixo”. Claro que são pessoas, instituições cheias de gente que têm como objectivo investir com lucro, o maior lucro possível.

E quem são eles?

Claro, os investidores deste mundo globalizado! Os poderosos, com os cofres cheios de dinheiro e tempo de sobra para delinear estratégias que levem a amealhar mais e mais, cujas projecções não contemplam a miséria dos outros ou o direito à subsistência dos povos.

Esses poderosos não são os Governos de países, que alguém no passado recente intitulava como do “eixo do mal”, como também não são os dos países emergentes, os únicos a ganharem dinheiro hoje em dia e, portanto, conotados eventualmente como possíveis investidores!

Se nos quedarmos a pensar, são os Bancos, os bancos de todo o mundo, com primazia para aqueles que funcionam em Países que são os motores das economias!

Não será difícil adivinharmos donde!

Entre eles, do País que vai aconselhando todos os dias a fazermos mais pelo deficit, incentivando a novas propostas de PECs, a persuadir que as medidas propostas não convencem os mercados.

Bem nos foram dizendo nas cimeiras da União Europeu que tínhamos de fazer o trabalho de casa, ou seja, forçando-nos aos PEC 1, 2, 3, 4...

Reconheço que fomos atabalhoados nas propostas, sem planeamento estratégico, apenas contabilizando cortes acima de cortes, impostos acima de impostos. Tal foi era a contenda, que os PECs não tiveram fim. E, claro, não vão ter fim!

Só se delinearmos uma estratégia de longo prazo de desenvolvimento do País que contente os Mercados.

Reparem! O que fazem os empresários quando desejam ajuda financeira para um investimento? Um Plano de Negócio que apresentam ao seu banco! Mas um plano mal estruturado tem um fim fácil de adivinhar.

Quem são os Mercados? Os Bancos! Logo...

Acham que os nossos PECs foram bons Planos de Negócio? Que respondem aos nossos males intrínsecos? Que vão garantir o pagamento a prazo dos nossos deficits crónicos? Que convencem os Mercados (leiam-se Bancos, por favor) a baixar os juros?

Ora as Agências Internacionais de rating, no passado recente, foram ludibriadas com a crise de 2008 nos Estados Unidos, esqueceram-se de baixar os rating aos bancos que, pouco depois, se apresentaram à insolvência.

Meu Deus, agora, andam a par dos Mercados, estes sobem juros, semana a semana e as Agências descem os indicadores de solvabilidade do País.

Tudo muito da Teoria da Economia. Nada de se estranhar, portanto!

Os Mercados não são cegos! (Talvez só “humanamente” cegos, mas isso é de outro mundo, eles são só investidores logo, só vêem dinheiro).

Só nos estão a dizer que não estamos a fazer o nosso trabalho de casa, que o nosso plano de negócios está mal apresentado, assim não nos financiam a juros baixos!

Todos sabemos como funcionam os bancos, o que representa o famoso spreed bancário que aumenta o valor das prestações mensais da nossa casa se não oferecemos suficientes garantias de termos um salário equilibrado com o crédito que solicitamos.

Pois é, a Economia do Estado é a mesma que as contas cá na nossa casa.

Três premissas:

Os Mercados são os grandes responsáveis pela crise.

As Pessoas utilizam-se deles para ganhar dinheiro.

A Globalização criou-os.

Já conectei os grandes bancos mundiais com essas terríveis identidades desconhecidas. E não estamos muito longe da verdade se acrescentarmos ao role alguns multimilionários deste planeta globalizado.

Querem saber como funcionam os Mercados?

Conto-vos uma história passada há uns anos neste minúsculo país chamado Portugal. Brincava-se à bolsa através da compra e venda fictícia de acções, preenchendo uns folhetos que se enviavam pelo correio para um determinado jornal. Cada jogador seleccionava uma empresa real cotada em bolsa, comprava as tais acções fictícias e aguardava as cotações reais saídas na sessão bolsista de cada 6ª feira. No dia seguinte tínhamos os resultados no jornal. Faziam-se as contas e quem tivesse maior lucro ganhava a ronda. No final, depois de umas tantas semanas desta brincadeira, o jogador que mais amealhava este lucro aparente ganhava umas centenas de contos pagos pela organização do jogo.

Eu pouco percebia de bolsa mas joguei interessado nas duas vertentes, entender o mecanismo e, se possível, ganhar o prémio final. Santa ingenuidade!!!

Na maioria das semanas o vencedor foi sempre o mesmo, um pequeno/grande empresário/milionário português.

Sorte?

Fui analisando o percurso das cotações das empresas escolhidas semana a semana por essa pessoa.

E sabem o que acontecia?

Na 6ª feira as acções subiam. No início da semana seguinte desciam. Com o tempo percebi estar na presença de um perito no assunto. Como? Especulava, literalmente, com dinheiro vivo na empresa que escolhera, fazendo subir o valor das acções. Na 2ª feira vendia. Ganhava dinheiro e o concurso semanal.

E, claro, ganhou o tal prémio que eu, ingénuo, cobiçara.

Os “mercados” são estas pessoas!

Escolhem, nas bolsas de todo mundo, as empresas com fragilidades conhecidas e investem as necessárias somas na compra ou na venda das suas acções. Especulam fazendo crescer as cotações para depois realizarem mais valias.

Vejam a bolha imobiliária de 2008. Avaliações prediais muito acima do valores para colocarem mais dinheiro nas mãos dos especuladores. Resultado, descapitalizaram e destruíram instituições financeiras.

Depois da destabilização, com governos enfrentando a crise da confiança na economia mundial, desculparam-se com a volatilidade dos mercados, como não fossem eles próprios a provocar os acontecimentos e a lucrar com o caos instalado.

O dinheiro é terrível, talvez a arma mais poderosa do universo. Governa o mundo a seu belo prazer.

Soluções?

Gostaria de as ter, mas estamos num estádio ainda embrionário, sem meios de combate a este flagelo que a globalização portou. A seu tempo encontrar-se-ão meios para combater este capitalismo desenfreado. O pior, é a sua terrível capacidade dominadora e estarem em conluio com a maioria dos Governos na Terra.

Como dominá-lo?

Não sei! Só sei que os Políticos não têm soluções e terão de ser eles a encontrarem-nas.

Onde e como vamos encontrar uma saída para este Mundo?

Ninguém duvida dos actuais termos da crise, pois não? Não era difícil perceber que a globalização iria despoletar “gigantes” adormecidos. A China, a India, os países mais a Oriente, o Brasil... Os tais países ditos emergentes.

Até porque os milhões de pessoas, que vivem nesses países, um dia, também, acordariam para o consumo.

Com a explosão, inevitável, dos tais países emergentes, e agora a generalidade dos países muçulmanos bradando por direitos básicos, como vamos continuar esta desenfreada correria para o “mais e mais”?

Á vista, temos o crescimento dos preços da energia, dos bens alimentares, o alastrar da miséria.

Como ver um futuro assim?

Com crescimento dos salários que farão face ás crescentes necessidades? Ou na falta deles, a contestação generalizada de todos nós?

As explosões sociais sempre provocaram as grandes alterações da sociedade. Ok! É para aí que nos devemos encaminhar? Temos de nos pôr a pensar...

Uma explosão social está nascendo. Compreendo-a nos países onde se luta pelas condições básicas de vida. Não no Ocidente, não creio que vá resolver coisa alguma. Não serão as greves, antes pelo contrário.

Acho que será através da consciência de todos nós, donos das grandes industrias a baixarem o seus lucros sim, mas todos nós a fazermos a nossa parte, não gritando aos ouvidos do governo, a quem atribuímos culpa de tudo, mas dinamizando as pequenas industrias, aumentando a produtividade, explorando outras energias, não tão cruéis para o mundo e sua ecologia, pondo em prática as já inúmeras investigações conducentes à melhoria das nossas condições alimentares, enérgicas... de vida, em suma!

Fazendo oposição de uma forma inteligente: aumentam o petróleo, então vamos apostar nas energias renováveis, vamos adaptar os nossos carros a outras energias, vamos trabalhar para tornar a sua produção menos dispendiosa e logo mais barata aos consumidores... Se são empresários, vamos fazer com que os nossos produtos sejam fabricados de forma a gastarmos menos energia, vamos contratar designers para os repensar, vamos contrariar a tendência dos que enriquecem à nossa custa... E isto podemos fazer optando por comprar os produtos certos, optando por gerir a nossa vida e respectivos recursos de outra forma.

O caminho para as empresas será procurarem todos os momentos a multiplicação dos lucros, a guerra dos mercados, a exploração de condições, por vezes anómalas, que provocam o acréscimo sucessivo do lucro?

Como será o mundo no futuro próximo – direi que já lá chegámos – se a par da multiplicação da população mundial em zonas do planeta onde grassa a miséria e um Ocidente com falta de rejuvenescimento onde já se discute o dinheiro que cada um ganha não chega para alimentar as necessidades dos reformados, dos nossos velhos?

As teorias da Economia têm de ser mudadas.

Substituam o conceito do Dinheiro, por outro que equacione a vida como prioridade. O dinheiro nunca chegou para todos e hoje, diminuem drasticamente as condições de acesso a ele por quem o tinha ou utilizava, milhões de criaturas no mundo levantam-se contra ele e os malefícios que a si provocam, como a fome ou a sua condição sub-humana de vida.

A continuação deste quadro será a derrota da humanidade, a paz, onde ela exista, será substituída pela inquietude permanente do amanhã, da fraqueza dos nossos princípios, pela visão sofredora do nosso vizinho, dos tormentos que nasceram com a convivência global que o Homem, e bem, provocou.

Não precisamos provocar uma terceira guerra mundial, que nos dizimaria sem apelo, nem queixar-nos do que o governo não faz ou fez...

Pode custar a transição mas já há mais do que suficiente informação para podermos pôr tudo isto em prática!

Utopias? Eu sei que não. Não podemos deixar que se ultrapasse o “limiar da ruptura”, situação em que nos encontramos.

Isto era “não dar espaço ao Homem para viver”.

E o “Homem” somos todos nós.

Assim, talvez, ainda tenhamos meios de sobrevivência.

Espero que todos acreditem que não há Lua ou outro planeta que nos valha se dermos cabo deste.

Tudo são desafios que decorrem da economia de serviços, que hoje predomina, da necessidade de cada vez mais qualificação para o trabalho, a generalização do trabalho feminino, que alterou qualitativamente a sociedade familiar, com a quebra da fecundidade, do divórcio, da esperança de vida, de novas formas de pobreza.

Terá de haver nova abordagem destas questões.

O Estado-Providência terá de assumir maior dinâmica, olhando os novos percursos individuais no mundo do trabalho, como as desigualdades entre os géneros e as gerações. A ideia é pensar quais são os investimentos a fazer e onde de modo a que não seja preciso compensar amanhã? Trata-se de alcançar uma estratégia preventiva, fundada numa nova lógica de investimento social, centrada no valor da igualdade, das crianças, a quem desde muito cedo devem ser garantidas todas as oportunidades, das mulheres, potenciando o efeito em dominó da sua emancipação, e dos reformados, tratando em equidade, os âmbitos geracional e intergeracional.

Bem se diz que a educação é o melhor bem duma sociedade. Foi um outro ponto que descurámos.

Isso e a nossa miopia evolucionista.


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